quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Visconde do Rio Branco vive diante de contrastes que o tempo criou


                                                                                                                                                             


Poderíamos  usar a expressão de Jacynto Batalha “Um passeio no tempo”, no seu documentário histórico apresentado no Festival de Cinema de Visconde do Rio Branco “Geraldo Santos Pereira” realizado no fim do mês passado.

O filme tem um viés romântico e nos desperta saudosismo, quando nos limitamos a observar pessoas e fatos de um passado conduzido dentro dos limites da cidade que não entrara na era do crescimento urbano.  Ficou no tempo em que nos limites da Praça 28 de Setembro e seu entorno havia um conjunto arquitetônico harmonioso e que serviu de base para filmagens com enredo de época. 

Até aí, os  jovens, à medida que se encontravam habilitados em alguma profissão e precisavam trabalhar, saíam do Município para buscar melhores condições de vida nas cidades grandes, sobretudo São Paulo e Rio de Janeiro. 

Quem buscava tentar a sorte em São Paulo, eram predominantemente oriundos da zona rural. Por causa dessa migração, durante muito tempo o número de habitantes mantinha certa estabilidade. Quem ficava, vivia do corte de cana e dos serviços mais humildes por falta de especialização. Alguns poucos,  que chegavam aos  cursos médios, se empregavam em banco ou escritórios diversos, e no comércio.


Usina Rio Branco  - 1913 - Imagem: www.novomilenio.inf.br

Rua Teófilo Otôni. à Esquerda acervo da Usina São João. Imagem: Isah Baptista

 A estrada de ferro, existente desde o tempo do Império(1880), contribuiu até certo tempo para a população manter estreita ligação com a cidade do Rio de Janeiro. Muitos foram procurar emprego, constituíram família e passaram a entrar no rol dos rio-branqueses ausentes.  Isto durou até São Paulo puxar a Revolução Industrial e implantar com predominância as fábricas de veículos, que, por sua vez forçou o crescimento da metalurgia. Eram trabalhos pesados, bem remunerados, e que não exigiam grau de escolaridade alta. Foi o que provocou o êxodo rural em toda a região.  No começo da década de 1970, houve motivo para criação de linha de ônibus direta daqui para a capital paulista. E no ABCD passaram a conviver muitos de nossos conterrâneos de origem rural.

A migração durou até os anos 90. A partir daí, os limites de espaço para os trabalhadores de fora deram sinais de esgotamento.  Na verdade, atingia o inchaço populacional, com a alta densidade demográfica, e as suas consequências de desemprego e violência, à medida que as fábricas se aprofundavam na informática e na robotização das funções operárias.  Braços cruzados.  Queda de oportunidades, que se espalhava pelo Brasil inteiro.

A alternativa passou a ser retornar às origens.  E quem saiu da roça e havia se acostumado nas cidades não sentia atrativos para retornar à lavoura.  Muitos pegaram suas indenizações, venderam seus bens, e vieram de volta.

O crescimento urbano aconteceu. De 25.000 habitantes em 1970, chega aos 38.000 nos dias de hoje. Sem planejamento, entretanto. Sem estudos  que considerassem topografia, equilíbrio ecológico, áreas de risco.
Imaginava-se um crescimento habitacional no plano horizontal, às margens das rodovias e estradas que ligam o Município aos municípios vizinhos e à zona rural, sem risco de desmoronamento e das enchentes. Isto está no instinto de sobrevivência racional.  E a enchente de 1932 e outras posteriores, como a do fim dos anos  50, já deixavam aviso sobre os limites inconvenientes para construções. E teria que ser levada em conta a preservação das áreas necessárias à absorção das chuvas no perímetro urbano.

Nenhuma dessas precauções foi observada. Os bairros e loteamentos surgiram morro acima, morro abaixo, às margens dos  rios Chopotó e Piedade, formando galhos nos píncaros das ruas principais de origem desde a Aldeia dos Coroados, Presídio e Paróquia de São João Batista.  Vias básicas: Santo Antônio, Rua Nova, Água Limpa, Rua  dos Pedros, Chácara, Piedade, Pito Aceso, Estrada da Colônia...

Se antes já houvera as enchentes de advertência, agora que as áreas verdes foram substituídas por asfalto e cimento armando, as chuvas caem e vão direto para as partes baixas em direção ao leito do rio. Matas ciliares foram extintas transformados em bairros.desde as margens do Chopotó e do Pidedade até os altos dos morros 

As valas de escoamento das águas fluviais tinham pouca capacidade de receber as águas pluviais, sem transbordar.

A construção de vias de trânsito e prédios à beira do rio criou imensas áreas de risco, que vêm desde o Bairro da Piedade, por um lado, desde a proximidade da Igreja Santo Antônio, por outro, passam pela confluência(encontro) dos dois, segue cidade abaixo, até terminar o perímetro urbano a caminho de Guidoval.



Quando tomamos certos pontos de observação, vemos muitas construções que se tornaram áreas de riso. Das proximidades da Ponte do Dr. Lelé, as obras dentro do rio estão no Piedade acima, como parte do Bairro Veneza(este nome não é por acaso). Na descida do Chopotó, em direção à Ponte do Carrapicho, de um lado e de outro estão as construções ocupando o espaço por onde passariam as enchentes.  O desmoronamento do prédio de 02 pavimentos, com uma vítima fatal,  em frente ao “encontro” em novembro de 2010, revela o quadro de perigo para todo aquele corredor que margeia esse rio.


Da Ponte do Carrapicho, para cima e para baixo, a situação continua a mesma: obras avançadas obstruem o fluxo das águas nas cheias. A partir dessa ponte, há, de um lado, a Rua Dr. Altino Peluso, antiga e conhecida como Caminho da Vovó, ou Rua da Feirinha. Do lado esquerdo começa a Av.  Beira-Rio, onde dois prédios já parecem pendurados, devido à erosão que limitou à metade o uso da pista de rolamento.  E segue com muitos pontos onde a cada período de chuvas há desmoronamento, que cobram reparos de arrimo, caros e cada vez mais a começar no fundo do rio.
Na ponte da Água Limpa, um prédio de um lado, e outro do outro, ocupam a metade do rio.  Tanto é que, de qualquer lado que se olhe a Ponte, só se vê a metade dela. 
O Rio segue por um trecho intransitável até a estreita Ponte da Cooperativa, na Rua Diogo Braga, próximo ao Posto de Saúde.  Dali até a Ponte Branca, na Av. Oscar Salermo(Barreiro), residências, lojas,  oficinas e até um pequeno loteamento se encontram em completa área de risco.  O fundo do rio está com pequena diferença de nível para a Avenida. Na última enchente(02/01/2012), houve erosão de vários trechos da pista, que ficou algum tempo interditada para obras de reparação. Imagens dessa enchente mostram as construções atingidas até as janelas pelas águas. 
Depois que as águas baixaram, cada um fazendo a faxina dos entulhos e das águas barrentas, a vida parece que volta ao normal.  Mas o tempo passa veloz.  Daqui a dois meses estamos em outubro.   Se hoje a meteorologia anunciou “Tempo nublado com chuvisco”, daqui a pouco estaremos em plena  Primavera que, para nós, tem ares de começo de Verão. Nuvens escuras aparecem e trazem precipitações pluviométricas.  Em 2010 a enchente aconteceu em novembro.  A última veio no começo de janeiro.  Tem havido uma variação de meses de uma para outra. Observa-se que, à medida que cresce a população urbana, diminui o tempo entre uma enchente e outra. A eliminação das áreas verdes, contribui para o crescimento das águas dentro do Rio. 
Para existir a Avenida dentro da cidade, era imprescindível analisar a capacidade cúbica do vale por onde passam as enchentes.  A Natureza ensina.  As cheias a partir de 1932 alertavam.  Ou se teria que afundar e alargar o Rio para pelo menos o dobro de sua capacidade, ou não se poderia ter construído vias de trânsito às suas margens. Muito menos concederem-se alvarás de construção nessas áreas. Duas vítimas fatais e prejuízos aconteceram nas duas últimas enchentes.  Estamos diante de tragédias anunciadas a cada novo Verão. A sociedade, junto com os mandatários dos três poderes, tem que estudar e tomar medidas preventivas para que o problema não se multiplique. Não estamos fazendo alarme. Estamos analisando fatos.
(Franklin Netto – conscienciadamata@gmail.com)


 

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